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Curitiba,20/04/2024

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Os mercados de ações terão de procurar um novo motor de desempenho

Atualmente, já não surpreende que a forma como os bancos centrais lidaram com a grande crise financeira de 2008 tenha impulsionado mais os mercados financeiros do que efetivamente relançado a atividade econômica nos últimos dez anos. No entanto, dificilmente pode-se censurar os bancos centrais: perante a abdicação dos governos, ocupados a tentar reduzir os seus déficites, os bancos centrais assumiram o controle e utilizaram a única arma da qual dispunham: atuar sobre o custo do dinheiro. Ao encorajar uma descida das taxas de juros sem precedentes ou, como se diz no jargão dos banqueiros centrais, ao tornar a "liquidez monetária" abundante e barata, os bancos evitaram, primeiramente, uma crise econômica grave, permitindo aos titulares de obrigações (cujos preços evoluem no sentido contrário às taxas de juros) e de ações beneficiar-se de mercados em alta de alcance histórico desde 2009. A esperança era que o enriquecimento dos aforradores lhes permitisse consumir mais, que as empresas se beneficiassem de custos de financiamento muito reduzidos para investir e que os Estados tirassem partido deste períodopelos bancos centrais para se desendividarem. Infelizmente, os investimentos de produção das empresas mantiveram-se muito tímidos e a fragilidade persistente do mercado de trabalho impediu uma recuperação do consumo. E, ao mesmo tempo, os governos desfrutaram globalmente do benefício de taxas de juros baixas para adiarem as suas boas intenções de reduzir a dívida.

Atualmente, surgiu um novo abrandamento econômico geral. Portanto, tanto nos Estados Unidos como na Europa, os bancos centrais preparam-se para aplicar novamente a mesma receita durante o mês de setembro de 2019: injetar liquidez adicional no sistema financeiro.

O primeiro problema enfrentado nesta nova fase de voluntarismo monetário é a temível lei dos rendimentos decrescentes. Segundo esta regra, tão velha quanto a ciência econômica, a repetição de qualquer esforço produz cada vez menos efeito ao longo do tempo. É o que se passa atualmente com a descida das taxas de juros: já desceram tanto até a data que uma redução adicional está condenada a ter pouco impacto. Isto é válido para a economia: as empresas, muitas vezes já bastante endividadas e preocupadas com a sua carteira de encomendas, estarão pouco dispostas a aumentar os seus investimentos, mesmo que o seu financiamento se torne mais barato. Isto, também, é válido para os mercados. É certo que a descida das taxas de juros se refletirá mecanicamente no preço das obrigações, mas está condenada a ver o seu efeito sobre os mercados de ações a esboroar-se.

O segundo problema é que esta lei dos rendimentos decrescentes está se transformando a lei dos rendimentos negativos: a descida das taxas de juros não só apoia cada vez menos um aumento de consumo, como também está mesmo começando a prejudicar o consumo. Este fenômeno é fácil de compreender: abaixo de um determinado rendimento, se as suas poupanças investidas em produtos obrigatórios  já não renderem grande coisa, deverá então preparar-se para poupar mais a fim de manter os mesmos rendimentos. Isto é confirmado pela análise dos fluxos para os fundos obrigacionistas e monetários, que atingiram valores históricos desde o início do ano de 2019 apesardos rendimentos oferecidos cada vez mais baixos. Paralelamente, a descida das taxas de juros levou ao desmoronamento da rentabilidade dos bancos. Para a economia, isto significa que uma descida continuada das taxas de juros diretoras por parte do banco central começa, paradoxalmente, a ter efeitos negativos no consumo e no investimento. A consequência para os mercados é que desta vez não ocorra o fenômeno habitual de vasos comunicantes segundo o qual, abaixo de um certo nível de rendimentos das obrigações, os fluxos dos aforradores regressam inevitavelmente aos mercados de ações.

 

Esta inversão das consequências da descida das taxas de juros está longe de ser insignificante. De fato, a maior parte do otimismo dos investidores em ações nos últimos dez anos tem por base o fato de o compromisso dos bancos centrais em baixar as taxas de juros ter garantido quase automaticamente uma subida dos mercados de ações. O que é que alimentará a sua confiança no futuro, sobretudo se a economia real abrandar? Os próprios bancos centrais e os governos não podem ficar indiferentes a esta questão: a financeirização da economia, especialmente nos Estados Unidos e na Europa, tornou a economia real sensível ao desempenho dos mercados financeiros. Uma forte descida dos mercados de ações teria, sem dúvida, um impacto negativo na confiança das empresas e dos consumidores.

Deste modo, parece ser cada vez mais indispensável tentar outra solução que não seja uma descida infinita das taxas de juros, liderada pelos bancos centrais como nos últimos dez anos, a fim de evitar o risco de um forte abrandamento econômico generalizado. A ideia de um relançamento pelos governos, há muito excluída devido à falta de margem de manobra orçamental, vai-se instalando. A Alemanha, que dispõe de margem de manobra, mostrou-se sempre reticente, mas o abrandamento acentuado da sua economia industrial começou a fazer refletir os seus dirigentes. E, para os outros países da zona euro, é provável que o banco central europeu (sob a alçada de Christine Lagarde) deseje ajudar os países mais necessitados a financiar os planos de relançamento credíveis. No caso dos Estados Unidos de Donald Trump, já sabemos que pouco se importam com a ortodoxia orçamental. O projeto de tal alteração da ação dos poderes públicos ainda não está amadurecido e, por enquanto, são os bancos centrais que têm a palavra. No entanto, poderá ser um evento de extrema importância para os aforradores em 2020. 




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